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segunda-feira, 28 de março de 2011

A porta.


“Eu não te amo!” disse ao homem cujo o único crime era o de não me amar. Eu, parada na porta da casa dele, aos prantos com uma caixa de recordações nas mãos. Ele logo reconheceu a caixa, e perguntou o que eu fazia ali com ela nas mãos. Respondi que trouxe pra devolver, mas que agora, repensei e trouxe pra dar fim a tudo aquilo. Rasgava quatro anos das nossas vidas, e aos poucos iam caindo no chão trechos de aniversários de namoro e de “Eu te amo”. Ele olhava pra mim e pedia que eu parasse porque “tudo ia ficar bem, um dia”. Larguei tudo no chão, e deixei ele parado na porta, inerte, observando a caixa e mil pedacinhos de cartas e coisas que um dia fizeram tanto sentido pra nós dois.

Agora eu já estava em casa, esparramada na cama. Tinha acabado de tomar um banho de horas, entrei no chuveiro com muitas lágrimas e lembranças; saí de lá pensativa, ainda chorosa. A noite anterior não saía da minha cabeça. Pela milésima vez ele tinha me dito que não queria mais nada comigo, que ainda tinha dúvidas sobre o que sentia por mim, (depois de todos esses anos) mas que precisava de mim, da minha amizade sempre. Por muitas vezes tentamos ser só amigos, tentamos não nos falar mais, tentamos ser só ficantes, tentamos ser namorados… Enfim tentamos tudo! Não entendia porque duas pessoas que se gostam, que tem tanto carinho uma pela outra, não conseguiam encontrar uma forma de conviver na qual não se machucassem.

Nas nossas muitas idas e vindas, era como se ele tivesse um radar, sempre que eu tava bem, superava tudo, ele voltava e me confundia toda pra me trazer de volta pra ele. Eu sou uma segurança pra ele, ele me tem como um porto dele, como se eu sempre fosse estar aqui quando ele quiser voltar. E eu sempre estive mesmo. Não gosto de joguinhos, nunca fui do tipo que esconde o que sente. Dizem que é só olhar pra mim que eu deixo transparecer o que penso e sinto, não ia ser diferente quando o assunto é amor.

Dessa vez, eu tinha me prometido, não tinha mais volta. Quando ele viesse usar o diabo do radar dele eu ia correr o mais rápido que eu pudesse e priu, não ia ter como me achar. Decidi que ia viajar, passar uns meses fora me faria bem até demais. Fui, e quando voltei, ele ainda estava aqui junto com todos os problemas que deixei pra trás (droga, cade aqueles roteiros hollywoodianos em que a mocinha viaja e tudo se resolve?). Não conseguia evitar o que sentia por ele, também não tem nome, esse sentimento pra mim. Mas ele existe, mesmo que eu não saiba explicar, definir, exemplificar, ele tá aqui comigo. Tentei refazer minha vida, arrumei um novo paquera (daqueles que todas as garotas sempre quiseram ter algo, mas sempre o consideraram impossível, inclusive eu) e tudo mais. Aos poucos fui me reconstruindo e quando já estava quase refeita eis que o fantasma dele ressurge, como era de se esperar.

É claro que tudo que envolve ele me balança muito, mas eu fui firme na minha decisão, não deixei ele entrar na minha vida. E quanto mais eu fugia dele, mais ele vinha atrás, dizendo que “no final tudo dá certo e se não deu é porque não era o fim; que eu sabia que a gente tinha um sentimento muito forte em comum e que mesmo que ele nem soubesse dizer exatamente que sentimento é esse, ele sabia que eu também sentia”. Era verdade, mas, eu não tinha que aguentar esse lenga-lenga, eu tinha feito minha opção, simplesmente não dava mais pra mim. Agora o que eu buscava era amor de verdade, daqueles bem resolvidos e bem sentidos.

Se você me perguntasse uns anos atrás o que ele representava pra mim, eu diria que ele era o amor da minha vida, que eu sabia que iriamos nos casar no fim de tudo. Mas, depois de tudo que passamos, os sentimentos foram se perdendo e se confundindo. Todas as minhas certezas do começo do nosso relacionamento desapareceram. Agora eu já não sei se realmente gostava dele, ou se gostava da pessoa que me tornava ao lado dele, não sei de mais de nada.

Nesse momento destruí o porto dele, agora eu não estava mais aqui pra ele, como era de se esperar. Eu buscava um navio novo, chamado felicidade. E não importa qual a intensidade desse sentimento que temos em comum, ele vai ficar aqui trancado, no fundo do coração. Porque de nada adianta muito sentimento, se na prática não há sincronia, entendimento. Pouparei meu coração de ficar a vida inteira assim, nesse vai e volta. Acredite ou não, tive um professor de geografia que lia mãos. Ele disse que no amor, eu encontraria alguém que ia me magoar bastante, e que iríamos viver entre “tapas e beijos”, mas que ele ia me fazer muito feliz também. Quem sabe ele não acertou? Vou saber, um dia.

“Eu te amo!” disse agora ao homem cujo o único crime era de amar demais e não sabê-lo, “não é por falta de amor que não vai dar certo, é que somos destrutivos, temos que permanecer longe, se esse é o único jeito de ficarmos protegidos. Porque, às vezes, é pior amor demais, do que a falta dele”. Fechei a porta, agora ele ficou lá, novamente inerte… Com a caixa nas mãos e num saquinho os pedaços de carta.

A porta que muitas vezes é a passagem para novas oportunidades, e que nesse caso, havia presenciado tantos beijos, palavras e momentos bonitos; presenciava agora o fim.

Tiago Iorc e Liah - Outra porta

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