Carol olhou ao redor, tudo naquele parque a faria rir, tempos atrás. Ela adorava ver as crianças correndo na grama, comendo algodão-doce, jogando bola, e trocando experiências. Hoje ela só conseguia sentir inveja daqueles rostinhos felizes. Só sentia um vazio no peito, um vazio enorme, daqueles que nos deixam paradas, entregues ao automático do dia a dia. Carol vivia seus dias por viver, sem emoção… Vivia um dia esperando pelo outro, talvez um dia em especial, o que ela encontraria a felicidade novamente.
Ela sempre teve uma pulga atrás da orelha com o amor. Será que um dia vou encontrar o amor da minha vida? E será que só existe um amor da minha vida? Porque tantas pessoas nunca encontram o seu? E o destino existe? Será que ele controla mesmo a nossa vida e a gente não tem muito o que fazer? Eram muitas questões passando pela sua cabeça ao mesmo tempo, e tudo isso enquanto olhava um casal de velhinhos fazendo sua caminhada matinal de mãos dadas. Ele era mais velho, a mulher sempre preocupada com ele, observando o caminho por onde passariam. E a maneira como se olhavam? Com uma ternura inigualável. Aquilo era bem como amor verdadeiro, imaginou Carol.
Pensou na sua dieta e resolveu que um algodão-doce não seria tão trágico e a deixaria mais alegre. Hesitou, resolveu não comprar. “É açúcar, Carol, só açúcar… Não é açúcar que vai te trazer alegria”, alegou mentalmente para a Carol refletida no vidro do carrinho de algodão-doce. Passou rápido pelo carrinho para não mudar de idéia, e não olhou para trás. Pegou o caminho de casa, que não era muito longe, saindo do parque pelo portão azul, era só chegar no final da rua e virar à esquerda. Seguiu distraída com suas questões, ouvindo “La vie en rose”.
Chegou no prédio, deu bom dia ao porteiro e pegou o jornal. Pegou o elevador de serviço, e viu um vizinho de paletó e gravata, pensou que ele devia ser advogado ou trabalhar com algo sério e provavelmente chato. Com pena do dia chato que o vizinho teria no seu trabalho chato, deu um bom dia exageradamente contente e puxou algum assunto bobo, do tipo “capa de jornal”. O vizinho saiu do elevador e Carol estava novamente sozinha; ela, seus pensamentos e Edith Piaf.
Abriu a porta, e observou que o chaveiro de coração estava meio rasgado. “Preciso comprar outro, por sinal, um mais bonito. Ela nunca teve bom gosto pra chaveiros, não vou precisar mentir. ‘Quebrou vó’. Ótimo! É o que vou dizer…”, pensou. Fechou a porta e jogou as chaves na mesinha de centro junto com o jornal. Foi direto pro banheiro, tirando a roupa no caminho, como era de costume cada peça em uma parte do trajeto, a calcinha foi a única peça que foi parar no cesto de roupa suja, como sempre. Ligou a ducha bem quente e se enfiou lá, por alguns minutos. Limpou com a mão o suor do box, e viu o relógio na parede do quarto, estava atrasada.
Resolveu que ia comer na cafeteria que tinha em frente ao trabalho. Correu, se vestiu, se maquiou, e saiu de casa com o cabelo molhado e despenteado. Chamou o elevador e no espelho do hall viu que estava descabelada, abriu a porta de casa, pegou a primeira escova que viu e aproveitou pra pegar o jornal que tinha esquecido na mesinha de centro. Foi trabalhar, pensando: “hoje é sexta, o dia vai voar, logo mais estarei em casa vendo algum DVD, comendo pipoca e tomando coca.”, esse pensamento realmente a deixou mais feliz.
Atendeu alguns telefonemas, fez alguns, olhou sua agenda e resolveu suas pendências. Olhou para Alba, sua secretária, e disse que ela poderia sair mais cedo hoje. Com certeza Alba teria mais problemas que ela, a julgar por suas olheiras. Sentou-se em sua mesinha, ligou o notebook e começou a pensar no próximo tema para sua coluna. Lembrou-se de suas questões, começou a pensar porque tinham escolhido ela para essa coluna. “Como é que eu vou falar de amor e relacionamentos com tantas dúvidas? Talvez seja a hora de me demitir, virar hippie e vender colares na praia”, pensou. Carol riu, e disse para ela mesma: “Não, melhor não!”. A verdade é que ela amava escrever, principalmente sobre amor e relacionamentos. Porque escrever a ajudava a entender o que acontecia com ela e com todo mundo.
Ela saía nas ruas imaginando situações de filme. “Agora ele vai passar correndo por mim, derrubar meu café em cima de mim. Vai olhar pra mim e me pedir mil perdões, talvez tentará limpar. Eu sorrio e digo que tudo bem, ele se encanta. Não perde tempo e me chama para fazermos alguma coisa qualquer dia. Dou meu telefone e no mesmo dia, mais tarde, ele liga e combinamos tudo. Uns tempos depois casamos e temos lindos filhos, aí vem o ‘felizes para sempre…’”. Carol sempre ria depois de imaginar essas situações e nunca nada do que ela imaginava acontecia.
18:30, nada de coluna pronta, significava trabalho para o final de semana. “E daí? Faço sábado”. Pegou suas coisas, desligou o computador e saiu. Foi pra garagem, avistou um cara “nem-lindo-nem-feio”, sua cabeça já começou a se encher se suposições… “Agora ele vem, e eu seguro o elevador para ele, eu escorrego e caio em cima dele (…)”. Não, Carol, não dessa vez. Ele entrou no carro e ela também, e lá se foi mais um possível amor da sua vida.
Num sinal desses qualquer, Carol viu que estava amarelo e acelerou pra passar, mas viu que não ia dar e freou bruscamente. O carro de trás acabou batendo nela. Ela pensou que nada poderia ser pior que isso, se olhou no espelhinho do carro e fez um esboço da sua cara mais antipática. Pensou duas vezes no que iria dizer e saiu do carro já falando: “Olha, me desculpa… Não estou nos meus melhores dias, sei que a culpa foi…”. Olhou para o dono do carro e tentou não sorrir, era o cara do estacionamento. “Às vezes, nossas fantasias se realizam, talvez não exatamente como imaginamos, maas…”, pensou ela. Aproveita Carol, o filme só começou.
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