O corpo que caminha é o mesmo que volta atrás. O corpo que dá as mãos é o mesmo que cruza os braços. O corpo que faz carinho é o mesmo que vira as costas. O corpo que deita do lado e em cima é o mesmo que fica em pé, frente a frente. O corpo que ajoelha calmamente é o mesmo que vai andando apressado.
Os cabelos que se deixam brincar esparramados na cama, são os mesmos presos em coque, num dia ruim. Os cabelos que recebem um cafuné, são os mesmos que ficam de frente pra você, quando viro as costas. Os cabelos que fazem cócegas na sua bochecha durante um beijo, são os mesmos que ficam presos atrás das orelhas, distantes, numa discussão.
A boca que beija é a mesma que diz “acabou”. A boca que ama é aquela que um dia vai calar. A boca que grita um alto e sonoro “EU TE AMO” é a mesma que xinga. Mas isso tudo, nada é comparado aos olhos. Os olhos são sempre os olhos, mesmo que tristes, mesmo sorridentes, são os olhos que carregam toda a sinceridade de você.
São eles a porta de entrada para a alma de alguém. Não é a boca dando seu primeiro “oi”. Não é o nariz ao sentir o primeiro cheiro. Não é o corpo se dirigindo ao primeiro contato. Não é a tão falada “pele”. São os olhos, que antes de tudo, têm a percepção e a dimensão. Os olhos nunca mentem, escondem, ou omitem. Pra quem sabe ler, eles tudo dizem. E saiba você que cada par de olhos têm o seu leitor especial, aquele que sabe ler você por inteiro, aquele que consegue saber exatamente o que cada olhar seu ou piscada mais lenta quer dizer.
No começo o vazio de palavras é preenchido pelos beijos. Ao fim, o vazio de beijos é preenchido pelas palavras. Mas, e o olhar? Onde anda o olhar? O olhar no início é curioso, de quem quer parar só pra observar, capturar todos os detalhes pra que a memória possa registrar. Ao fim, o olhar conhece muito, consegue até imaginar a presença de quem não está. O olhar nesse todo tempo, não sabe mentir. Ele não diz que ama se não amar, nem diz que não ama, se amar.
Só de te encontrar muda muito, mas encontrar meu olhar com o teu olhar, muda tudo. De tanto olhar tenho a visão automática e cega de você. Minhas mãos já te enxergam por completo no escuro e não tem a ver com a forma, os cílios, o modo da sobrancelha repousar, nem com o tom castanho exatamente igual ao meu. Se trata apenas do brilho deles ao encontrar os meus, coisa que eu nunca vou esquecer.
Tem a ver também com a sensação transmitida por eles, a cada situação. Durante um abraço, durante um cafuné, durante o meu choro, ou uma briga. Não finja que esqueceu tudo o que sentiu quando seus olhos escorregavam entre as palavras que escrevi pra você numa folha de caderno, enquanto os meus escorregavam em lágrimas.
Gosto de lembrar deles cerrando, junto com uma risada gostosa, depois de qualquer besteira que eu tenha dito. Ou de um beijinho de borboleta que eles me deram. E o mais difícil é perder o meu olhar do seu. É ver com meus próprios olhos os seus olhos, olhando outros olhos.
Mas, que fique claro, todas as lembranças que gravaram os meus olhos, são guardadas e revividas quando eles fechados, em modo cego, descobrem uma maneira de te encontrar.
E a cada novo lugar que o meu corpo visita, meus olhos buscam de olhar em olhar, algum que seja causador de tanta curiosidade como era o seu. Não tão bonito, não com o mesmo brilho, não com o mesmo amor, porque eu sei que não existe. E eu me pergunto se um dia você vai encontrar, algum outro olhar que entenda o seu como o meu.
E isso tudo nada mais é que uma inútil tentativa de expressar o que são os seus olhos quando encontram os meus olhos. E mais ainda, o que acontece com o resto de mim durante esse encontro. Hoje você é o que me dizem seus olhos, mesmo que sua boca tente mentir.
Enquanto escrevo, leio e releio, imaginando você lendo. Sabendo que cada palavra é sua. E agora, imagino também seus olhos correndo para o “x” de fechar a janela. Me dando mais um adeus, dessa vez, um adeus cego pra mim. Agora, meus olhos, apesar de andarem sempre em par, sentem-se sós.
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